terça-feira, 17 de junho de 2014

“A Dance With Dragons”, de George RR Martin




“A reader lives a thousand lives before he dies,” said Jojen. “The man who never reads lives only one. The singers of the forest had no books. No ink, no parchment, no written language. Instead they had the trees, and the weirwoods above all. When they died, they went into the woods, into leaf and limb and root, and the trees remembered. All their songs and spells, their histories and prayers, everything they knew about this world. Maesters will tell you that the weirwoods are sacred to the old gods. The singers believe they are the old gods. When singers die they become part of that godhood.”

Ai, Martin, Martin, que vontade de te partir as trombas… E a minha análise ao quinto livro da saga podia ficar por aqui. Depois de já ter dedicado inúmeros artigos neste blogue a “A Song of Ice and Fire” já me começam a falar palavras (e adjectivos antipáticos) para dedicar ao autor.
Recapitulemos: quem se dá ao trabalho de ler as baboseiras que eu por aqui escrevo lembrar-se-á que o livro anterior, A Feast For Crows, não me agradou minimamente. Tendo isto como ponto de partida, as minhas expectativas para A Dance With Dragons eram manifestamente baixas.
Podemos dividir as 1117 páginas do livro em 3 partes. As duas primeiras são manifestamente boas. A última, é um complete train wreck.
O livro começa excepcionalmente bem, ao contrário do que eu esperava. A acção é retomada com a nossa personagem preferida, Tyrion Lannister, que o senhor Martin fez o favor de remover da história por completo durante o livro anterior. Ficamos a saber qual o destino do Imp após os “acontecimentos que precipitaram a sua saída de King’s Landing” (vou procurar evitar qualquer tipo de spoilers, apesar de por esta altura ter sérias dúvidas que exista alguém a nível do planeta que ainda não saiba tudo o que se passa na história), à medida que o autor nos faz – novamente – o favor de introduzir mais 438 personagens semi-aleatórias. Mas, as viagens de Tyrion (que passa metade das 1117 páginas a andar de barco), até são um dos pontos altos da história. Muito interessantes, cativantes, com cenários bem idealizados, e uma série de diálogos muito bons com as ditas 438 novas personagens. Uma delas até acaba por trazer um considerável twist à história, embora isso fique guardado para o(s) próximo(s) livro(s). O melhor capítulo do livro até é um dos que envolve Tyrion, quando este vai à Merchant House da Vogarro’s Widow em Volantis. Todo o capítulo é soberbo. A descrição da caminhada de Tyrion por Volantis, passando pelo Templo Vermelho, toda a envolvência do entreposto e das suas figuras, culminando na fabulosa viúva (ou, meretriz). Divino! A personagem é deslumbrante, de longe a melhor que Martin criou em todo o livro, pelo que admira que não morra passadas duas páginas.
Inicialmente, a história até se encontra muito bem estruturada, essencialmente dividida em dois “grandes temas”, onde metade das personagens parece estar a encaminhar-se para Meereen, e a outra metade para os eventos no Norte. Isto dá consistência ao livro, por oposição ao que se vinha a passar nos livros anteriores, onde todas as personagens parecem andar à toa pelo mapa, cada uma sem bússola, e sem rumo aparente.
O problema é que Martin continuou a escrever… Se o livro acabasse lá para a página 700 ou 800 até era um dos melhores da saga. Mas, ao seu estilo habitual, o nosso amigo não quis evitar o descarrilamento ferroviário da praxe.
Enquanto a história está centrada no Norte, nomeadamente na personagem do Reek, é muito boa. A destruição que o autor faz de Theon Greyjoy é desconcertante. A relação deste com Ramsay Bolton é do mais psicologicamente grotesco que existe na saga. O crescimento de Ramsay é quase incómodo, chegando ao ponto de a personagem se tornar mais odiosa do que o próprio Joffrey. Aliás, um dos grandes apelativos deste livro é o omnipresente clima de desespero em que quase todas as personagens estão inseridas.
Quem também tem direito a capítulos muito bons é Bran. Quando este finalmente chega “aonde deve chegar”, os leitores não conseguem evitar um “oooooh!” A citação que escolhi para abrir este artigo remete para um desses momentos. Tratam-se dos capítulos mais místicos do livro, e toda a cenografia final (as árvores…) é maravilhosamente agridoce. O problema é que a meio do livro… Martin esquece-se da personagem! Assim, sem mais nem menos. Tem direito aos tais capítulos excelentes, e algures a meio do livro “olha, ficas na gaveta porque não me apetece escrever mais a teu respeito”.
Nota-se claramente a transição entre a parte boa e a parte má de “A Dance With Dragons”. Chega a um ponto em que o livro se perde por completo. Começam a reaparecer as personagens que até ao momento estavam “hibernadas”, mas aparecem todas de forma quase inconsequente, sem qualquer integração coerente na história, e fazem o ritmo do livro descer de 80 para 8 num estalar de dedos. Temos situações tão idiotas como a Brienne aparecer para dizer uma frase… e voltar a desaparecer. E a terceira parte do livro é toda assim. As personagens vão ressurgindo, com o intuito único de dizer “olá, estou vivo, e agora vou outra vez embora”. É mau. Não sei bem qual é a relação do Martin com a editora, mas arrisco dizer que é nenhuma. Isto parece um daqueles filmes que não passam pelas mãos de um editor, e que resultam numa coisa sem pés nem cabeça. É chato ir assistindo ao definhar do livro à medida que os capítulos vão decorrendo.
E por último, como não podia deixar de ser, temos o “toque de Martin” guardado para os capítulos finais. Sim, porque não há livro de “A Song of Ice and Fire” que termine sem haver um episódio de “vamos matar trinta gajos de maneiras estúpidas”. E chegados a este ponto já são mesmo estúpidas. Para não dizer repetidas. Porque o senhor já nem se dá ao trabalho de pensar em formas de matar personagens, limitando-se a copiar o que fez nos livros anteriores. Chega ao cúmulo do ridículo de, num dos últimos capítulos, uma das personagens – na última página do capítulo – estar a falar normalmente com alguém, e de repente vira-se para trás e espetam-lhe uma adaga na barriga. Deveras interessante, não haja dúvidas… Também já aprendemos que nesta saga ninguém “morre verdadeiramente”, e que de um livro para o outro “olha, afinal este não morreu MESMO”. Cliché. Aborrecido. Desmotivante.
Dá-me a sensação que boa parte da malta que leu os livros já olha para os dois (ou três) que ainda hão-de vir e pensa “olha, porra, já que li até aqui…” Confesso que o interesse na história já não é muito. Se isto se tivesse resumido aos três primeiros livros, Martin teria criado uma trilogia extraordinária e envolvente. Mas a burrice de “vamos fazer render o peixe” foi destruindo a história aos poucos. No início, era algo sobre a luta de famílias sedentas de poder. Presentemente, é uma telenovela reles, com gente mutilada, sem braços, sem mãos, sem nariz, sem orelhas, sem… sim, sem isso que vocês estão a pensar! Já que este grunho se dá ao luxo de matar uma personagem neste livro “com uma pila congelada enfiada pela boca abaixo”… (a psicóloga dele deve ter material q.b. para fazer quatro teses de Doutoramento)
Já não resta qualquer esperança quanto ao desfecho dos livros. A HBO parece-me estar a fazer um trabalho bem melhor com a adaptação televisiva, e a descartar boa parte da palha sem sentido que polui os livros.
Ao fim de cinco livros, creio que “A Song of Ice and Fire” pode ser descrita da seguinte forma: um conjunto alargado de personagens maravilhosamente escritas que vagueia aleatoriamente por um mapa imaginado, onde metade morre de forma estapafúrdia, e metade é esquecida algures ao longo do caminho.

terça-feira, 3 de junho de 2014

X-MEN: Dias de Um Futuro Esquecido




Como já não ia ver um filme de super-heróis há muito tempo, eis que decidi ir ver “X-MEN: Dias de Um Futuro Esquecido”. Como o título é demasiado grande, doravante vou-me referir ao filme como “X5”. Isto porque é o quinto filme da saga X-MEN. Ou o sétimo, se tivermos em conta os dois Wolverines.
Eu nunca fui particularmente entusiasta dos filmes da saga. Excepto os do Wolverine, que como toda a gente por aqui sabe considero ambos o “best movie ever”. Verdadeiramente, somente o “X-MEN: First Class” (2011) me parece um filme acima da média. Há boas notícias: a minha opinião mantém-se!
Tinha alguma expectativa em relação a este X5. O trailer parecia antever algo muito bom, juntando um elenco de ultra-luxo, onde se reuniam os actores dos “dois universos” dos filmes. Infelizmente, fiquei com a sensação que este foi mais um daqueles casos em que o trailer é melhor do que o próprio filme.
A história não é nada de excitante, contrastando com aquilo que o trailer fazia crer. Eu sou sempre reticente a estas histórias das viagens no tempo, e o Passado que altera o Futuro e funhéfunhéfunhé. Mas isso é uma embirração pessoal. Aqui a premissa é algo mais original. É a mente do Wolverine que é enviada ao passado para tentar mudar o rumo da História por causa de um evento em particular. E esta creio ser a principal desilusão do filme. Não temos verdadeiramente uma interacção entre “os dois elencos”. Temos um cheirinho da malta do Futuro, à espera de ver o que acontece com a malta do Passado. Talvez seja coerente, mas sabe a pouco.
A realização do filme (Bryan Singer) não é particularmente entusiasmante, embora tenha dois pontos que a meu ver se destacam. Dado que boa parte dele é passado nos anos 70, há uma série de sequências a imitar a gravação da altura, onde somos transportados para os meios técnicos desse período, com algum excesso de cor na televisão, e as frames-per-second algo saltitantes. Perdoem não saber os termos técnicos precisos destas coisas… E depois há a extraordinária “cena da cozinha”, que é do melhor que vi em cinema recentemente. Uma sequência com uma personagem (Quicksilver) a mover-se à velocidade da luz dentro de uma cozinha, enquanto tudo está a mover-se em slow motion ao seu redor vai interagindo com os vários elementos de uma forma muito cómica. O filme vale quase só por esta cena.
O desempenho dos actores também não se pode dizer que seja extraordinário, salvo duas excepções. Muitos destes actores eram semidesconhecidos quando apareceram nos filmes da saga, caso de Hugh Jackman e Halle Barry. Os próprios Michael Fassbender e Jennifer Lawrence ainda não tinham o reconhecimento meteórico destes anos mais recentes. Compreendo que para alguns voltar a vestir estes papéis 14 anos depois não é muito apelativo. A grande excepção é mesmo Hugh Jackman, que já deve estar farto de vestir a pele de Wolverine ao fim de sete filmes, mas que mesmo assim demonstra que é um profissional muito sério, e até faz um Wolverine um pouco diferente do habitual, bastante mais maduro, sério e com grande discernimento.
A outra excepção é James McAvoy, que é fabuloso como jovem Professor Xavier. Aliás, McAvoy é um actor excepcional, mas que infelizmente nunca atingiu o estrelato. É pena, pois estou seguro que é dos mais talentosos actores da sua geração. Ainda é novo, pode ser que o tempo lhe faça justiça. Até hoje não o vi uma única vez a ser menos do que brilhante. A carga emocional e a expressão facial que coloca em cada cena são dignas de registo.
Quanto aos restantes, Fassbender está a anos-luz do nível com que participou em “First Class”, os veteranos Ian McKellan e Patrick Stewart pouco tempo de antena têm, e falta um vilão carismático como existiu em “First Class” com o magnífico Kevin Bacon.
É de enaltecer o esforço de integrar a história dos X-Men com a História tal como a conhecemos. No entanto, isso resulta n vezes melhor no “First Class” com a crise dos mísseis em Cuba. Este filme limita-se a um relance à guerra do Vietname, e à conferência de paz que se seguiu, assinada em Paris.
Tudo sabe a pouco. As cenas de acção no Futuro, com os Sentinelas (robots gigantes), estão bem conseguidas, mas têm pouco de original. E já estamos tão fartos de as ver no cinema… A intriga/trama política não tem dimensão q.b., e a própria filosofia dos temas abordados já está bastante batida. Não é verdadeiramente um filme de acção, não é verdadeiramente um filme de drama, nem é verdadeiramente um filme de super-heróis.
Há algumas dedicatórias extraordinárias no filme – daquelas coisas que os realizadores gostam de fazer cada vez com mais frequência – como é o caso de um episódio da série original de Star Trek estar a passar na televisão a dada altura, e o facto de o Quicksilver usar uma t-shirt com a capa do “Dark Side of the Moon”.
Não me vou dar ao trabalho de mencionar alguns erros de pormenor que se detectam no filme, mas vou referir a curiosidade única do local escolhido para aprisionar o Magneto. Portanto, estamos a falar do vilão mais temido do mundo, capaz de controlar tudo o que é metal, e que tem que ser preso num bunker subterrâneo a não-sei-quantos metros de profundidade, cujo único acesso é através de um elevador que dá para um corredor onde estão 20 guardas. E para onde é que dá o elevador? Nem mais: para a cozinha do Pentágono. Simplesmente o sítio onde existem mais facas, garfos, tachos, e objectos de metal…

Pelo Melhor
O filme é competente, surpreende pela reunião do elenco, é diversificado, e tem cenas muito interessantes (como a da cozinha em slow motion).

Pelo Pior
O sentimento de “isto sabe a pouco” com que saímos da sala de cinema. Havia aqui tanto potencial, e no fim é apenas um bom filme de entretenimento, mas que não se destaca por qualquer coisa em particular. Especialmente, revendo “X-Men: First Class” depois deste é fácil perceber que o filme anterior está num patamar muito superior.