Rubens, Brueghel e Lorrain são os “cabeças de cartaz” da exposição que o
Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) organizou, fruto de uma parceria com o
Museu do Prado. 57 pinturas foram trazidas de Madrid para Lisboa, para dar um
cheirinho da colecção que o Prado tem de pintura flamenga e holandesa do século
XVII. É a primeira vez que Portugal recebe uma colecção de obras do Prado, e
quem gosta da escola flamenga já foi
certamente a correr deleitar os olhos com as obras expostas.
As paisagens retratadas nas obras são o tema central da exposição,
contrastando os ricos bosques de cores naturais com a vivacidade das cores do
vestuário das pessoas e animais que por eles passeiam. Sem margem para dúvidas,
Rubens é o principal atractivo, figurando na galeria dos pintores mais importantes
de todos os tempos. Mas foi Brueghel, O
Velho, quem mais me despertou a atenção na visita, pois não o conhecia e
fiquei surpreendido pela positiva com boa parte do que vi. É deveras
interessante verificar que o quadro que tem servido como “cartaz” da exposição
resulta de uma colaboração entre Rubens e Brueghel: A Visão de Santo Huberto.
PETER PAUL RUBENS e JAN BRUEGHEL, O VELHO
Visão de Santo Huberto
c. 1617-1620
Óleo sobre madeira - 63 x 100 cm
© Madrid, Museu Nacional do Prado
Visão de Santo Huberto
c. 1617-1620
Óleo sobre madeira - 63 x 100 cm
© Madrid, Museu Nacional do Prado
Cenas bucólicas, festas e bodas campestres, paisagens de Inverno, e a
sempre presente mitologia Grega, compõem os temas representados nos quadros,
onde geralmente a paisagem é retratada numa escala imensa por comparação com as
personagens que nela deambulam.
A exposição está bastante interessante, embora me pareça que seja essencialmente
indicada para apreciadores deste tipo de pintura. Convém não esquecer que temos
no Museu Gulbenkian quadros de Rubens que em nada ficam atrás destes.
Sinto que o MNAA anda com uma dinâmica muito viva nos últimos tempos, o
que me apraz, pois já o visitei pelo menos quatro vezes, e não me importo nada
de “ter uma nova razão para lá ir outra vez”. “A Paisagem Nórdica do Museu do Prado”
é sem dúvida um sucesso, pois o número de visitantes não mente (no dia em que
fui estava a abarrotar de gente), e a inteligente campanha publicitária teve
seguramente um papel fundamental ao puxar tanta gente. No entanto, fiquei estupefacto
ao ler há uns meses que este “acordo de parceria” entre o MNAA e o Prado, que
resulta numa troca temporária de obras, vai levar “As Tentações de Santo Antão”
para Madrid. Vamos lá a ver se nos entendemos: eu gosto muito de pintura, e gosto
muito de Rubens, mas tudo aquilo que (pelo menos até este momento) veio do
Prado para cá são “coisas menos importantes” quando comparadas com a nossa “jóia
da coroa”. “As Tentações de Santo Antão”, de Bosch, são uma coisa única em toda
a História, e merecem estar entre as 50 ou 100 obras fundamentais e
irrepetíveis criadas pelo Homem. Paisagens bucólicas, campestres, coisas
bonitas do século XVII, e Virgens com o
Menino há a pontapés, e para todos os gostos. Nunca percebo estas “parcerias
entre Portugal e Espanha”, onde os espanhóis nos mandam uns rebuçados para
estarmos entretidos, e os voluntariosos Portugueses vão a correr enviar o bolo
de noiva. “As Tentações de Santo Antão” (link)
são daquelas coisas que não deviam sair do MNAA por nada deste mundo (excepto
se os Italianos enviassem para cá as estátuas de Bernini como moeda de troca –
aí, sim, seria admissível). Gosto muito dos protocolos de intercâmbio entre os
grandes museus, mas amiguinhos… há limites!
Dito isto, quem estiver interessado é visitar a exposição até dia 30 de
Março, e se não gostarem das pinturas, ao menos deleitem-se com os comentários
dos “intelectuais” que fazem questão de comentar de forma muy erudita o que estão a ver nos museus. Têm dúvidas? Deixo alguns
exemplos…
«Rubens? Com “S”? Não devia ser Ru-BEN? Porquê o “S” no fim?» - aparentemente os curadores dos museus são
particularmente criativos e gostam de alterar o nome dos artistas.
«Hummm, estas cores… não sei. Acho
que não estão… não sei. Mas… não, este não me convence.» - que chatice, mas quem é que se lembrou de
colocar num museu uma obra apreciada por milhares de pessoas há mais de 400
anos sem pedir a douta opinião da Sôdona Etelvina, que não sabe porquê, mas
acha que não!
«1443? Então mas se dizem que isto
é do século XVII… 1443 é século XV.» - tem
toda a razão minha senhora… mas 1443 é o número de inventário do quadro.
«Pois, que conveniente! Pintam as mulheres
todas nuas, mas depois metem um trapinho colorido só a tapar a parte que
interessa. Enfim… sem comentários!» - calma,
jovem, não esquecer que este quadrinho não foi pintado pelo Miró na semana
passada… cheira-me que as cortes nos séculos XVI e XVII eram capazes de ficar
um pouco melindradas se vissem um quadro de 1m x 1m escarrapachado na parede
com uma data de mulheres a mostrar a… “paisagem”!
Em suma, se não apreciarem a pintura, ao menos apreciam os comentários
destes génios da cultura que um dia destes estarão a desempenhar a função de
comentadores especialistas num qualquer canal de televisão.
Dito isto, aos interessados, é aproveitar até 30 de Março: http://www.pradoemlisboa.pt/pt
Bónus
Ora bem, como a parte deste artigo de que vocês mais gostaram foi
certamente a das “pérolas dos comentadores”, aqui fica mais uma para vosso
deleite.
Junto à Custódia de Belém, uma
das obras de arte essenciais do nosso património, estão duas simpáticas
velhotas.
«Aquelas 12 figuras na parte de cima, ouvi dizer, são os 12 apóstolos.
Mas, também já me disseram que não são…»
«Pois, eu ouvi dizer que 11 deles eram os apóstolos, mas que depois havia
um que não era…»
Tem toda a razão, Dona Laura! Venha
daí uma Tese de Doutoramento. Até já estou a imaginar a dissertação: Gil
Vicente, ao qual se atribui a criação da Custódia de Belém, não gostava de um
apóstolo em particular, e portanto pensou: olha, como não gosto daquele gajo,
vou colocar aqui os outros 11, e depois para preencher o espaço em branco… meto
o Zé da Coelha, que é meu compadre!
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