Blinded by ambition.
Seduced by power. Destroyed by Rome.
Este é o teaser que aparece na capa do livro
“Lustrum”, do britânico Robert Harris, outro dos meus escritores-fetiche. Este teaser bastaria para me aguçar o
apetite, não fosse eu um fanático pela glória do Império Romano.
Lustrum é a segunda parte da
história da vida de um dos políticos mais importantes da História de Roma,
Cícero. A narrativa é contada na primeira pessoa por Tiro, o escravo que serviu
Cícero como secretário durante toda a sua carreira. Muito do livro é baseado
nos escritos de Tiro que sobreviveram ao Tempo. Lustrum é antecedido por
“Imperium”, que conta a história da ascensão política de Cícero, e que já de si
havia sido uma delícia. Regra geral, no cinema tal como nos livros, as sequelas
ficam aquém do original, mas isso não acontece neste caso.
Harris é verdadeiramente
genial na forma como desenha o ritmo da história. É um daqueles escritores que
não cria personagens perfeitas e invulneráveis. Cícero é apresentado como um
político brilhante, e a forma como Harris dá vida à oratória do senador faz-nos
ter vontade de estar sentados no Senado romano de outrora. Mas aos poucos,
Cícero começa a toldar-se pela vaidade, e a deixar-se seduzir pelo poder. E
como nos ensinaram as revistas do Homem-Aranha “com grande poder, vêm grandes
responsabilidades”. Cícero oscila entre o homem íntegro que não verga perante
os inimigos políticos que desejam fazer tombar toda a estrutura de Roma, e o
homem verdadeiramente de natureza humana que se deixa corromper, muitas das
vezes por vaidade, ou mera ambição.
A história desenvolve-se a
um passo alucinante, com todas as movimentações nos bastidores da política que
eram tão reais há 2000 anos como são agora. Em dois milénios não mudámos tanto
na nossa natureza como pensamos.
Mas nem só de Cícero vive a
história. Nomes como Júlio César e Pompeu são presenças centrais na trama. A
forma como César – o maior inimigo político de Cícero – é descrito é
verdadeiramente intoxicante. Como “declaração de intenções” devo dizer que sou
algo suspeito a falar de César, pois é talvez a figura da História que mais me
impressiona. Ele – tal como eu – foi dos poucos homens capazes de repensar o
mundo recriado segundo a sua mente brilhante. Depois disso tornou-se um tirano,
mas esse é um pequenino detalhe de somenos importância…
Não consigo distinguir quais
as partes dos discursos e factos que se baseiam no que realmente aconteceu, e
quais aqueles que saíram da imaginação do autor, mas se Roma tiver sido
minimamente parecido com o que nos é apresentado em Lustrum, não estranha que
tenha sido a sociedade que traçou as linhas gerais daquilo que hoje em dia
somos. E quão fascinante deveria ser poder viajar no Tempo e ter poderes de
invisibilidade para passear pelas ruas da cidade que foi o centro do mundo.
Cícero, o Pater Patriae imbatível na política,
Pompeu, o general mais poderoso do império, e César, o génio que parece ter
sido bafejado pelo toque cósmico que lhe permite fazer coisas que mais nenhum
mortal ousa sequer pensar. Tudo isto constrói Lustrum, um livro que não é
fácil, nem acessível a quem não tiver uma paixão forte por intriga política e
pelo conflito de conceitos e ideologias. Roma no seu auge, e à beira da
decadência. Os inimigos hoje, que se convertem nos aliados de amanhã. Os
altruístas de ontem, que se corrompem pela sua própria vaidade. E no centro de
tudo isto, o Poder. “Os Estados emergem e caem. O Poder nunca muda” é o teaser do primeiro livro. E como isto
nos faz lembrar do século XXI…
Robert Harris é um dos
mestres da ficção histórica, capaz de construir uma narrativa vívida, no meio
de uma história polvilhada de interesse e reviravoltas. O final de Lustrum é
absolutamente divino, deixando-nos a salivar pela conclusão da trilogia. É um
daqueles finais que raros escritores arriscam escrever.
Já devorei três “livros
romanos” de Harris: Pompeii, Imperium e Lustrum. Cada um é melhor do que o
outro. Se o meu deus do cinema, Ridley Scott, ao menos pegasse em qualquer um
destes livros e fizesse um filme que chegasse aos calcanhares do “Gladiador”…
eu ficava tão feliz que fazia um sacrifício de 50 virgens a Júpiter…
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