segunda-feira, 11 de maio de 2015

Capitão Falcão




Saudações patrióticas! Esta é a segunda vez em dois anos que falo de cinema Português. Tendo em conta que nas anteriores três décadas nunca havia visto (no cinema, pelo menos) qualquer filme na mais nobre língua da Humanidade, sinto-me a transbordar de patriotismo. Mas, importa perguntar: terei eu gostado tanto de "Capitão Falcão" como gostei de "A Gaiola Dourada"?
Há já uns dois anos que ando a "ouvir coisas" deste projecto. É o que dá viver em Portugal, esta imensa aldeia onde há sempre alguém que é amigo do amigo de um amigo do realizador do filme. Inicialmente até nem estava muito atento à coisa, mas quando há cerca de um ano vi o primeiro trailer... Opá, é difícil resistir a um super-herói Português, com bigode (obviamente), a desancar em comunistas vestidos de fato-macaco armados com foices e martelos!
Pois bem, Capitão Falcão é uma delícia! Um daqueles "prazeres culpados" (este é um texto patriótico, portanto nada de utilizar estrangeirismos) que nos fazem bem à alma. Para quem foi raptado por comuninjas, e tem passado os últimos meses aprisionado numa cave escura, há que dizer que Capitão Falcão é um filme de super-heróis passado no Portugal da década de sessenta, onde o intrépido Capitão Falcão e o seu leal companheiro, Puto Perdiz, defendem Portugal e o Senhor Presidente do Conselho, António de Oliveira Salazar, das ameaças do Comunismo e da Democracia. Sim, é uma comédia. Convém explicar isso desde já, não vá dar-se o caso de algum Espanhol estar a ler isto. Mais: é uma comédia politicamente incorrecta, e com doses de nonsense (ooops, estrangeirismo) muito ao estilo da comédia Britânica.
Há dois tipos de reacção possível ao filme: há quem delire com algo tão estapafúrdio, que tem a inteligência de não querer passar por "pseudo-humor pseudo-intelectual", e que soltará sonoras gargalhadas a cada "bolo de arroz" (não vou explicar), e há quem ache isto "uma coisa totalmente estúpida, ridícula, e sem qualquer nexo". As pessoas que se enquadram no segundo tipo são, por definição, Espanhóis.
O humor em Capitão Falcão é disparatado, absurdo, delirante, e é uma sátira hilariante que conjuga um Portugal bafiento com um "Batman Pop Anos 60". E é de chorar a rir. Há frases tão bem colocadas que ficarão na memória ao jeito de um "Why so serious?". O texto é deliciosamente inoportuno, e isso faz-me dar saltos de alegria na cadeira. Estou mais do que farto desta sociedade amorfa e borrega onde ninguém pode usar expressões que possam eventualmente ferir a susceptibilidade de qualquer indivíduo coitadinho que fique com traumas psicológicos para o resto da vida porque ouviu uma expressão feia que não se pode reproduzir. Religião? Raça? Género? Nada escapa ao mordaz argumento do filme. É, repito, um "prazer culpado".
É curioso ver que muitos dos envolvidos no filme estão de alguma forma ligados ao extraordinário "Odisseia", da RTP, de que falei na altura (link), e que foi das coisas mais brilhantes de produção nacional nos últimos anos (que infelizmente passou meio despercebido no meio da tanta bosta com que as nossas simpáticas televisões nos brindam). Pelo meio, há um sem-fim de referências a outros filmes e séries. A principal, como não poderia deixar de ser, é a série do Batman dos anos 60 (as cenas na mota com sidecar são primorosas), mas também há Guerra das EstrelasMonty Python e o Cálice Sagrado, Power Rangers, os filmes de artes marciais do Jacky Chan e companhia.
A parte menos boa do filme será porventura a direcção de actores. Não será um problema específico do filme, mas mais uma questão com o "estilo Português". Fico sempre com a sensação que os nossos actores estão a declamar, ou então assumem uma postura mais adequada ao teatro de revista. Gonçalo Waddington (mas que raio de estrangeirismo anti-patriótico!!!) já demonstrou ser um bom actor (relembro: Odisseia), e aqui assume uma onda muito over-the-top a beber um pouco dos trejeitos de Herman José nos seus saudosos sketches. Curiosamente, o actor que me pareceu melhor em todo o filme é precisamente um dos que nem abre a boca: Luís Vicente, que faz de Lenine, o mestre do transformismo (Bolo de Arroz?). Tenho pena que Nuno Lopes tenha "passado de raspão" pelo filme (é o mítico comuninja), pois é muito provavelmente o melhor actor Português da actualidade. Haja esperança por algo mais para um Capitão Falcão 2  (há cena após os créditos que para isso aponta!).
Não se pode falar de Capitão Falcão sem falar da banda sonora. Não sei se terá sido João Leitão (o realizador) a convidar Pedro Marques para tratar da música do filme, mas ao autor da ideia só consigo dizer: MUITO OBRIGADO! Que trabalho GE-NI-AL. A inspiração "pop-Batman-60's" a imprimir um cariz vibrante e cheio de energia ao filme é um deleite. A qualidade da música é verdadeiramente fabulosa e carrega o filme às costas. Já tentei procurar por mais informações sobre Pedro Marques, mas o Google não me ajudou muito. Mas quero estar atento ao trabalho deste senhor. Tal como Spielberg disse que metade do sucesso dos seus filmes se devia à música de John Williams, também João Leitão o pode dizer em relação a Pedro Marques. Aqui, temos Duo Dinâmico!
Julgo ter dito o que havia a dizer sobre Capitão Falcão. Haverá certamente muita gente cinzenta, que se leva demasiado a sério, e que não saberá apreciar uma sátira ligeira, sem compromisso, que faz um elogio ao absurdo, e joga com um sem-fim de influências divertidas. E, mais do que tudo isto, demonstra que FAZER HUMOR não é meramente dizer dez vezes merda e mais umas quantas caralhadas, e de seguida rir de forma boçal.
Resta-me terminar este artigo brindando todos os patrióticos leitores deste blogue com um sonoro:
ÉS PORTUGUÊS OU ÉS ESPANHOL?!?!?!
ÉS PORTUGUÊS OU ÉS ESPANHOL?!?!?!


Pelo Melhor
Além da já referida extraordinária música, o genuíno talento Português de rir de nós próprios. Ser inconveniente, arriscar, procurar fazer algo fora do habitual. Vai sendo raro nos dias que correm. Fazer rir num país cada vez mais triste é obra! Obrigado.

Pelo Pior
Lembrar que os pais de D. Afonso Henriques eram Espanhóis! HERESIA! Isto é mais ofensivo do que insinuar que eram... COMUNISTAS!!!

E como neste blogue também há cenas extra após os créditos, tomem lá que vale a pena:

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