quarta-feira, 5 de março de 2014

Pompeia




Pompeia. Todos conhecemos a sua história. Bom, todos menos os gajos envolvidos na criação deste filme, pois aparentemente esses acham que a história de Pompeia é a história do filme “Gladiador”, mas com um vulcão lá pelo meio.
O realizador, Paul W. S. Anderson, é conhecido por ser o responsável pelos filmes da saga “Resident Evil”. Acreditem quando vos digo que isso não é uma boa razão para se ser conhecido, porque esses filmes estão entre o que pior se faz no cinema. Tendo em conta este curriculum invejável, não fui ver o filme com as expectativas muito elevadas. Este filme consegue ser o exemplo perfeito de tudo o que está mal com o cinema de hoje-em-dia (Michael Bay, estás-me a ouvir?).
Comecemos pelo protagonista. É o Jon Snow, do Game of Thrones, também conhecido por Kit Harington. E basicamente é isso… Ele faz de Jon Snow, mas no meio de Romanos. Até acredito que a culpa não seja do rapaz. Quase aposto que foram ter com ele e lhe disseram “olha, é para fazeres de Jon Snow, ok?”. E pronto, ele fê-lo na perfeição. Exactamente a mesma voz cavernosa, o mesmo olhar de cachorrinho mimado, e o mesmo cabelo! Mas eu aqui vou perder alguns minutos para elogiar o cabelo do rapaz. A sério, vale a pena. Não me recordo, em toda a minha vida de cinéfilo, de ver um cabelo com maior protagonismo do que o próprio protagonista. É uma maravilha. O moço é um escravo, tratado abaixo de cão e à chicotada, e tem o cabelo mais bonito e arranjado do que as nobres damas Romanas. O moço leva porrada que se farta na arena, vai ao chão enquanto lhe esmurram as trombas, e logo de seguida levanta-se com o cabelo perfeitamente arranjado e sem um grão de areia. Não há um fio de cabelo fora do sítio. Melhor, quando começa a erupção, é cinza e calhaus a cair por todo o lado, e o cabelo do Sr. Snow permanece mais limpo do que num anúncio da Linic. Até a giraça que se apaixona por ele vê os seus longos e sedosos cabelos a ficarem cheios de cinza, enxovalhados, cheios de caca, enquanto o cabelo do seu apaixonado permanece protegido por um escudo invisível que nem a Enterprise do Capitão Kirk consegue ter.
Mas vamos à história. Vou presumir que toda a gente viu o “Gladiador” do Ridley Scott (caso contrário, não sei o que andaram a fazer com as vossas vidas nos últimos 14 anos). Pois bem, então vejam lá se isto vos é vagamente familiar... Há um gajo que é feito escravo e levado para uma escola de gladiadores. Hummm, onde é que eu já vi este filme… Enquanto gladiador, está sempre de trombas, e quando entra na arena mata tudo o que lhe põem à frente em menos de trinta segundos sem a mínima expressão facial. Hummm, onde é que eu já vi este filme… Na escola de gladiadores, faz amizade com outro escravo-gladiador, que por acaso é africano e a quem os Romanos mataram a família. Hummm, onde é que eu já vi este filme… A dada altura, são levados para a arena, onde é encenada uma grande vitória das legiões Romanas contra um qualquer inimigo revoltoso. Os escravos-gladiadores, com armas inferiores, e contra trinta vezes mais gajos, conseguem vencer os adversários. Hummm, onde é que eu já vi este filme… O antagonista, perante o resultado, comenta “Não é assim que eu me recordo desta história...” Hummm, onde é que eu já vi este filme… BOOOM! Explodiu um vulcão! Ah, pronto, então assim já não é uma cópia descarada do Gladiador!
E sabem qual é a parte mais engraçada? A parte boa do filme é aquela que se limita a copiar o Gladiador. Daí para a frente é o “Armageddon” do tal Michael Bay de quem eu tanto gosto… Só que ainda mais estúpido! Eu não sei o que esta malta de Hollywood toma ao pequeno-almoço, mas claramente têm alguma dificuldade em perceber o conceito de “exagerar até à estupidez”. Como se a erupção de um vulcão não fosse uma coisa suficientemente “bombástica”, toca de mandar em simultâneo um tsunami contra a cidade, no preciso momento em que as pessoas estão a fugir para as docas para tentar apanhar um navio. E esse tsunami que varre a cidade é tão “especial” que até conduz uma trirreme a direito pela rua principal da cidade. Woohoo! Muita fixe! Mas, esperem, temos que tornar isto ainda mais épico! E que tal fazermos um dos vários calhauzorros expelidos pelo Vesúvio acertar em cheio no meio de um dos navios que conseguiu sair das docas a tempo, e que – SÓ POR ACASO – leva no seu interior uma das personagens secundárias do filme? Mais! Mais! Queremos mais! Ok, ok, tive outra ideia brutal! BruuuuuuTAL! Então e que tal: estão a ver a tal giraça nobre Romana? Então, ela tem uma escrava que é, tipo, assim, prútantos, tipo, buéda amiga dela, e no momento em que o herói vai, tipo, salvar a giraça, o penhasco onde se situa a villa em que habitam desaba, arrastando metade da casa consigo, e pelo meio a escrava é engolida? Mas, tipo, a casa só desaba até ao sítio onde estão o herói e a amada. Aí nesse sítio há uma “razão de força maior” para parar o desabamento. Não é uma ideia muita fixe? Claro que é!
Que sorte tiveram os Romanos de não terem descoberto o Urânio enriquecido em 79 DC, caso contrário está-se mesmo a ver que o reactor nuclear que se situava mesmo por baixo da arena dos gladiadores começava a ter uma fuga naquele preciso momento. Bem, mas assim ao menos tínhamos a sorte de aparecer o Godzilla na Baía de Nápoles, e isso era muita fixe, porque depois o gajo começava a dar cabo das trirremes todas, e a matar as pessoas, e… Ah, não, espera, isso depois era copiar o Pacific Rim, e isso assim já não podia ser. Vá, pessoal, guardem lá o Godzilla para o próximo Transformers. Raios, ia ficar tão fixe um Godzillus Imperatus…
Creio já ter dado uma boa ideia do que é o filme… É pena, mas a “cultura da estupidificação de massas” é nisto que se traduz. A banalização de praticamente tudo acaba por destruir toda e qualquer coisa. Ainda mais pena é porque tanto Emily Browning como Kiefer Sutherland têm desempenhos muito bons. O “Senhor 24” é um actor fabuloso (digo-o há anos), e dá-se inclusive ao luxo de procurar fazer um trejeito vocal na personagem, dando-lhe uma pronúncia com um toque muito subtil (fez-me recordar a personagem dele no Dark City, de 1997, onde faz algo semelhante).
Não há muito mais a dizer do filme. É “cinema espectáculo” de má qualidade, com escrita medíocre, realização medíocre, clichés medíocres, e onde o melhorzinho até é a banda sonora (difícil de distinguir no meio de tanta banhada), de Clinton Shorter (não conheço), que merecerá da minha parte alguma atenção quando tiver oportunidade, em particular as peças corais que me ficaram no ouvido.
Em suma: o WS Anderson e o Michael Bay podem ir os dois fazer filmes apocalípticos para o lado negro da lua, porque já paravam de chatear a malta.

Pelo Melhor:
O cabelo do Jon Snow. Acreditem em mim. Nem os efeitos especiais do Gravidade conseguem fazer aquilo. Acho que devíamos começar uma campanha para o cabelo do moço ser nomeado ao Oscar para “best actor in a supporting role”.

Pelo Pior:
A banalização da cultura de merda. Assim, dito sem papas na língua. Quando existe tecnologia capaz de fazer planos aéreos deslumbrantes de uma cidade dos tempos áureos do Império, quando existem bons actores, quando existem todos os meios possíveis e imaginários para se criar cinema de qualidade, porquê, porquê, porquê, porquê insistir em fazer coisas tão medíocres? Chega ao ridículo de uma das personagens citar o tão famoso “Why so serious?”, só para “ter piada”. Que tristeza se tornou este século XXI que promove ad nauseum toda esta cultura banal do mastiga-deita-fora…



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